Domingo, 10 de Dezembro de 2023
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MAITÊ BAKALARCZYK

STJ decide que Lei Maria da Penha é aplicável às mulheres transexuais vítimas de violência



STJ decide que Lei Maria da Penha é aplicável às mulheres transexuais vítimas de violência

O preâmbulo da Lei Federal n.º 11.340/2006 já aduz que a lei “[...] cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do §8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. [...]”.

Verificamos que o objeto de proteção dessa lei é a mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião. Todas as mulheres gozam dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social, conforme preceitua o art. 2º, da lei.

Atente-se que a lei oferece proteção exclusivamente à mulher, e somente dentro do ambiente doméstico e familiar, para poder ter o respaldo da Lei Maria da Penha

Mas em um momento contemporâneo em que muito se discute a questão de gênero, precisa-se dar uma interpretação mais inclusiva do que é ser mulher, partindo-se da premissa de que não é somente o sexo biológico que define o gênero, mas também a identidade de gênero.

Se deveria limitar a aplicação da Lei Federal n.º 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) às mulheres cujo sexo biológico é feminino?

E essa é uma situação fática que vem se fazendo presente nos tribunais do país. E isso exigiu um posicionamento do Poder Judiciário.

Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento da Sexta Turma, decidiu por unanimidade, que a Lei Maria da Penha se aplica aos casos de violência doméstica ou familiar praticada contra mulheres transexuais. Vai colado um trecho da decisão:

"Este julgamento versa sobre a vulnerabilidade de uma categoria de seres humanos, que não pode ser resumida à objetividade de uma ciência exata. As existências e as relações humanas são complexas, e o direito não se deve alicerçar em discursos rasos, simplistas e reducionistas, especialmente nestes tempos de naturalização de falas de ódio contra minorias", afirmou o relator, Ministro Rogerio Schietti Cruz.

Ainda, em seu voto, o relator abordou os conceitos de sexo, gênero e identidade de gênero, com base na doutrina especializada e na Recomendação 128 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que adotou protocolo para julgamentos com perspectiva de gênero. Segundo o Ministro, "gênero é questão cultural, social, e significa interações entre homens e mulheres", enquanto sexo se refere às características biológicas dos aparelhos reprodutores feminino e masculino, de modo que, para ele, o conceito de sexo "não define a identidade de gênero".

O pronunciamento do STJ se deu no REsp 1.977.124, após um processo subir para o terceiro grau de jurisdição, em sede de recurso interposto pelo Ministério Público, após as medidas protetivas requeridas por uma mulher transexual que sofreu violência doméstica cometida pelo seu pai, por este não aceitar sua condição de transexual, ter sido negada pelo primeiro grau e pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (segundo grau) por ter se aplicado o entendimento de que a proteção da Lei Maria da Penha seria limitada à condição de mulher biológica (sexo biológico feminino).

Como fundamento recursal, o Ministério Público argumentou que não se trata de uma analogia entre a mulher biológica e a mulher transexual, mas sim de se fazer a aplicação da lei pelo seu texto legislativo, ou seja, a violência baseada em gênero e não em sexo biológico.

Foi uma decisão inédita e de suma importância para a luta das mulheres trans. Pela primeira vez o Superior Tribunal de Justiça se manifestou sobre a matéria, que com unanimidade, decidiu que a Lei Maria da Penha é aplicável à mulher trans vítima de violência doméstica ou familiar. E servirá como precedente para que outros tribunais sigam o entendimento firmado pela Corte do STJ.

 

 

👩 Maitê Alexandra Bakalarczyk Corrêa, Advogada - OAB/RS n.º 104.229 - Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais (Direito), Advogada, e Presidenta da Comissão da Mulher Advogada da OAB Subseção São Luiz Gonzaga (RS).

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